A relação entre nossos oceanos e as mudanças climáticas
Riscos e resiliênciaArtigo6 de junho de 2023
Os oceanos absorvem cerca de 25% de todas as emissões de CO2 da atmosfera. Isso está ajudando a reduzir o aquecimento global, mas também está colocando em risco os ecossistemas marinhos, por meio da acidificação dos oceanos.
É quase impossível exagerar a tamanha importância dos oceanos para a vida em nosso planeta. Cobrindo 71% da superfície da Terra, contendo 97% da água do mundo e produzindo entre 50-80% do oxigênio que respiramos, os oceanos formam um ecossistema global tão vasto e complexo quanto insubstituível.
Além disso, o verdadeiro valor dos oceanos ainda é amplamente desconhecido: mais de 80% dos mares do mundo ainda não foram mapeados e explorados, e os cientistas estimam que mais de 90% das espécies oceânicas ainda não foram formalmente classificadas. Assim como as florestas tropicais, corremos o risco de pôr em perigo os oceanos antes de entendermos completamente como são vitais para a nossa sobrevivência.
Como dito por Daniel Eherer, Gerente Sênior de Sustentabilidade do Grupo Zurich: “A forma como usamos os oceanos e seus recursos é uma grande questão geopolítica. É preciso haver um esforço internacional coordenado para conservação e gestão dos ecossistemas oceânicos, reconhecendo que eles não são um recurso ilimitado.”
O que é um sumidouro de carbono?
Nossos oceanos também exercem um papel crucial no combate às mudanças climáticas, em sua função de sumidouros naturais de carbono. Um sumidouro de carbono é algo que absorve mais carbono da atmosfera do que libera. Florestas, pântanos e solo são bons exemplos de sumidouros naturais de carbono. O oposto de sumidouro de carbono é fonte de carbono, algo que libera mais carbono na atmosfera do que absorve. A queima de combustíveis fósseis é um bom exemplo disso.
Os oceanos são um dos maiores sumidouros de carbono do mundo, absorvendo cerca de 25% de todas as emissões de CO2 da atmosfera. Um estudo científico estimou que, entre 1992 e 2018, os oceanos do mundo absorveram 73 bilhões de toneladas de CO2, quase o dobro das emissões totais de CO2 de combustíveis fósseis e processos industriais em 2020. Claramente, sem os oceanos desempenhando essa função, a crise climática seria ainda mais grave e urgente do que já é.
Como os oceanos absorvem o CO2?
O processo pelo qual os oceanos absorvem CO2 da atmosfera é algumas vezes denominado “bomba de carbono oceânica”, que é composta por dois sistemas principais: a bomba biológica e a bomba física.
A bomba biológica transfere o carbono da atmosfera e da superfície dos oceanos para o fundo do mar, através da rede trófica. Por exemplo, o plâncton absorve CO2 da atmosfera através da fotossíntese, e então é ingerido por outros organismos ou morre e afunda no oceano, onde o carbono que eles contêm pode ser armazenado em camadas de sedimentos por séculos.
A bomba física ocorre porque os oceanos também absorvem CO2 diretamente da atmosfera, se a concentração de CO2 for maior na atmosfera do que nos oceanos. Assim, à medida que a concentração de CO2 na atmosfera aumenta, como aconteceu nas últimas décadas, mais dele é dissolvido nas águas superficiais. A água mais densa desce para o fundo do mar, levando consigo o carbono dissolvido. O carbono dissolvido pode ficar retido ali por centenas de anos, enquanto se move lentamente pelas partes mais profundas dos oceanos, antes de retornar gradualmente à atmosfera.
Qual a função desempenhada pelos ecossistemas costeiros?
Ao considerar o valor dos oceanos como um sumidouro natural de carbono, é importante lembrar que as regiões costeiras também desempenham uma função relevante para mitigar as mudanças climáticas. Por exemplo, manguezais, pântanos salgados e ervas marinhas também absorvem CO2 da atmosfera. Na verdade, esses três exemplos de ecossistemas costeiros são capazes de captar e armazenar pelo menos 10 vezes mais carbono do que as florestas continentais e as florestas tropicais.
Essa é uma das razões pelas quais proteger os ecossistemas costeiros, que estão ameaçados pela poluição, mudança climática, urbanização, pesca predatória e turismo, é tão vital. Entre 30 e 50% dos manguezais do mundo foram perdidos durante os últimos 50 anos, e continuam a ser perdidos a uma taxa anual de 2%.
Como a absorção de tanto CO2 está afetando os oceanos?
Curiosamente, os oceanos nem sempre atuaram como sumidouros de carbono. Antes da Revolução Industrial, os oceanos eram, na verdade, um emissor líquido de carbono. Isso porque, naquela época, a concentração de carbono nos oceanos era maior do que na atmosfera. É somente com os aumentos causados pelos humanos na concentração de CO2 atmosférico que os oceanos foram forçados a assumir seu papel atual de absorvedores líquidos de CO2.
Isso tem um claro benefício inicial na luta contra as mudanças climáticas, porque ajuda a retardar o acúmulo de CO2 na atmosfera. No entanto, também tem um custo. Isso ocorre porque o aumento da concentração de CO2 nos oceanos altera a química da água do mar, tornando-a mais ácida. A acidificação dos oceanos pode ter um impacto extremamente prejudicial a uma variedade de organismos marinhos, como peixes, moluscos, ouriços-do-mar, corais e plâncton, o que também interrompe os processos de absorção de carbono da bomba biológica.
Como Eherer explica: “Os recifes de corais, como a Grande Barreira de Corais, enfrentam uma dupla ameaça das mudanças climáticas. A acidificação do oceano está afetando a força de seu esqueleto de carbonato, enquanto as temperaturas do mar mais elevadas causam eventos de branqueamento, em que os corais perdem algas simbióticas, o que pode acabar matando o coral. Os recifes de coral são ambientes muito sensíveis, mas também possuem imenso valor econômico, incluindo proteção contra inundações, turismo e fornecimento de berçários para espécies de peixes que são essenciais para a pesca, então, se você destruir os recifes de coral, poderá acabar não apenas destruindo o ecossistema do oceano inteiro, mas também partes relevantes de nossa economia.”
Assim como a própria Terra, os oceanos formam um sistema natural extraordinariamente complexo e interconectado. A atividade humana, especialmente o aumento prejudicial das emissões de gases de efeito estufa, já está mudando os oceanos de maneiras difíceis de serem compreendidas ou previstas. E como os oceanos formam um único ecossistema gigante conectando todos os sete continentes, será necessário um esforço verdadeiramente global para monitorá-los e protegê-los.