Gay, preto e pobre: Como as primeiras lutas fortaleceram a resiliência do homem gay

Diversidade e InclusãoArtigo20 de agosto de 2021

Ter tido uma infância com poucas vantagens além das agressões à sua orientação sexual, ajudou Phil Rodrigues a lidar com os desafios de se assumir gay. E num país onde os direitos dos homossexuais nem sempre são facilmente conquistados, segundo ele, é hora de lutar por uma sociedade melhor.

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Por Michael Bradford

Por ter crescido em uma família grande, tendo sua mãe como única provedora, Phil Rodrigues conhecia a adversidade. A vida não era fácil na movimentada cidade portuária de Belém, na região norte do Brasil.

“Vim de uma família pobre e não conheci meu pai”, ele se lembra. “Minha mãe era a única que conseguia ganhar algum dinheiro para sustentar uma família de 10 pessoas”.

O que ele não sabia então era que tal resiliência, necessária para passar por uma infância difícil, o serviria bem mais tarde na sua vida, quando ele enfrentaria ainda mais desafios devido à sua orientação sexual.

Se há uma receita para a resiliência, os ingredientes da vida de Phil estão nela. Gay, preto e pobre. Todas as minhas lutas me tornaram mais forte”.

“A minha mãe criou meu irmão, eu e meus primos”. Ela foi a nossa provedora financeira e emocional”, recorda Phil. “Ela largou seu trabalho para tomar conta da minha avó, que ficou doente e veio a falecer em seguida. A minha mãe já trabalhou em vários empregos, como manicure, lavadora de pratos e muitos outros para nos sustentar”.

Quando o seu irmão 10 anos mais velho conseguiu um emprego, Phil conseguiu se concentrar e completar seus estudos, antes disso também conseguir um emprego para ajudar.

Hoje, começando sua carreira como assessor na Zurich Brasil em Recife, Phil, quando olha para trás, vê uma vida em que se sentiu intimidado quando criança e ridicularizado quando jovem por conta de sua orientação sexual. “Não sofri violência, mas houve muita agressão verbal”, diz ele.


As dores do crescimento

Quando jovem, muitos dos seus amigos eram meninas e Phil reconhece que ele era um pouco afeminado. “Naquela época, eu pensava que era hétero”, diz ele, “e os insultos verbais como ‘bicha’ e ‘gay’ não me incomodavam. As meninas me defendiam”.
Infelizmente, o bullying é algo comum no Brasil, diz Phil. “Qualquer menino que se mostrar afeminado sofrerá bullying na escola. No meu caso, eu jogava futebol com os meninos até não me sentir mais à vontade. Eu me identificava mais com as meninas; era com elas que eu me conectava mais”.

Hoje, Phil entende que estava formando sua orientação sexual naquela época, e houve uma fase em que acreditava ser bissexual.

Aos 17 anos, ele compreendeu que era gay e decidiu não mais esconder isso das pessoas.

Alguns dos meninos que cresceram com ele o abandonaram. “Isso foi bastante triste, eu os considerava meus melhores amigos. Não entendi a decisão deles, mas aceitei. Sou o que sou”.

A notícia foi difícil para a mãe de Phil. “Quando era mais novo, ela queria que eu me tornasse padre e quando me assumi gay, foi muito difícil para ela entender”. Ela disse: ‘Ok, mas não aja como uma menina, não se transforme em uma mulher e não conte a ninguém’. Eu disse a ela: ‘Meus amigos mais próximos já sabem’”.

Saber que ele era gay não diminuiu o amor de sua mãe por ele. “Nosso relacionamento é ótimo”, diz Phil. “Mesmo naquela época, éramos muito próximos. Conversamos bastante sobre isso, hoje está tudo bem”.

O bullying sobre sua orientação sexual não acabou quando ele entrou na faculdade, lembra Phil. E não vinha dos estudantes. “Fiquei sabendo, depois de me formar, que alguns professores chamavam os alunos gays de ‘bicha’ e nos insultavam pelas costas”.


Luta pela aceitação

A atitude da sociedade em relação aos estilos de vida LGBT+ no Brasil é “complicada”, de acordo com Phil. “Não é totalmente aberta”, explica ele, mas também não está completamente fechada. O viés presidencial conservador do país não inspirou a aceitação da comunidade gay, diz ele, mas as eleições no próximo ano poderão mudar essa dinâmica.

O Brasil precisa crescer mais quando se trata dos direitos dos homossexuais, diz Phil, mas houve progresso nos últimos anos. “Temos o direito de casar com o mesmo sexo e ter os mesmos direitos que os casais heterossexuais”. Hoje, também, os gays podem doar sangue”. Antes, isso era proibido”.

Ser gay no Brasil é mais do que um estilo de vida, enfatiza Phil, é querer atuar para garantir que as coisas melhorem para a comunidade LGBT+. “Trata-se de lutar por uma sociedade melhor e pelos nossos direitos, assumindo uma postura política e social. Trata-se de ser respeitado como pessoa e lutar pelo que acreditamos”.


Orgulho em seu trabalho

Na Zurich, Phil encontrou aceitação entre seus colegas de trabalho e uma agradável parceira na aliança Pride@Zurich das redes LGBT+ da empresa. Os membros da Pride em todo o mundo têm um ambiente seguro para se conectarem uns com os outros nos assuntos LGBT+.

“Eu entrei na Pride assim que entrei na empresa; foi uma das primeiras coisas que fiz”, diz Phil. O grupo Pride, composto por 53 colegas de trabalho foi posto de lado por conta das restrições da COVID-19, que atingiu o Brasil de forma particularmente dura e suas atividades foram limitadas. “Estamos tomando medidas para tornar o Pride mais visível além de torná-lo mais atraente para o público não gay”. Este ano trabalhamos 100% online, mas no ano que vem esperamos que o novo normal nos permita ser muito mais ativos”.

Como muitos outros que têm lutado para encontrar sua sexualidade, várias vezes o caminho foi bastante difícil para Phil. Apesar dos desafios na luta pela igualdade de tratamento para pessoas LGBT+, ele, um jovem adulto, encontrou algum conforto em uma empresa que respeita suas escolhas.

“Ser gay não é o que me tornou resiliente”, diz Phil. “É uma das muitas coisas, minha infância e o bullying que sofri também me tornaram resiliente. Tudo isso me ajudou a formar minha personalidade e meu caráter, o que me trouxe até aqui, hoje”.